domingo, 14 de abril de 2019

Minha Filha II - Matryoshka

Hoje andei na mata e senti meu corpo cambalear, era cansaço. Andando na mata do tempo chuvoso, cercado de vida, de folhas que caem e que nascem, de pássaros que passam e que ficam, de gotas pendulando nas folhas, efêmeras e cruciais, senti meu corpo vibrar. Vibração de uma geração inteira no meu útero, senti o sangue quente em sua história percorrer meu corpo, uma sinfonia cigana, com fogueira e pés no chão, de mulheres fortes que alimentam-se de si e alimentam o outro com cada célula que transborda. Hoje andando pela mata, senti a herança dos elementos que deixo com minha filha, de uma canção ancestral, de uma batida tão ecoada que soma e soma a cada geração. É o sangue que queima, na água que cai, no ar que respiro e que ela no meu universo utero sente como o mundo todo. Andando na mata senti minha alma o mundo todo também, ela não isolada, ela e o sempre, ela e minha filha e o tempo, ela e minha mãe, vó e todo uma vida imensa que resiste e encontra fibras para Ser na aridez ou na vastidão.

sábado, 13 de abril de 2019

Amor acaba

Eu isolo
Desconjuro e viro a cara
para quem me disser que o amor acaba
Eu mudo a calçada
Reverto o passo
Corro para outra esquina
quem me vier com esse papo
que o amor acaba
Me escondo, sumo e ignoro
pirraço cantando alto
Sapateando tolice
viro revolta em meninice
E me atraco na rua de casa
para quem vier me contar que o amor acaba
Grito alto, pego a foice
Arranco o mato
Inspiro um murro
construo um muro
Viro o cabo
Acerto o talo
da palavra errada
que o amor acaba.

E em nada disso
com toda a força que me cabe
bem sei no fundo
que existe a possibilidade
que o tal do amor de verdade um dia acabe.